Eu, leitora, jornalista e ex-empresária circense
É... Eu realmente tinha vocação para Polyanna, Irmã Paula, sei lá...
Tinha. Não tenho mais.
Hoje estou casada e feliz.
Sim, cansei dessa vida de empresária circense.
E recomendo.
Bom... Mas estava lembrando de certa vez, quando ainda alimentava paixões frustradas por seres do sexo masculino.
Fui à entrega de um prêmio de imprensa badalado, em uma casa de espetáculos igualmente badalada, recheada de jornalistas badalados (e muitos amigos) e que ainda teve show com artista baiana badalada, que, dizem, sei lá, né, namora uma apresentadora de tv bem badalada também.
Mas, então...
Levei comigo um 'amiguinho' que já freqüentou minha vida durante um tempinho, mas que decidiu que seria só meu amigo...
Companhia agradável e divertida, o convidei pra ir comigo.
Tudo muito bom, tudo muito bem, bebida liberada, vinho tinto, vinho branco, cervejinha básica, whisky...
Eu fui no vinho tinto e o 'amiguinho' no branco.
Durante a premiação, o 'amiguinho' todo animadinho, falando no ouvido, se chegando... Ahã...
Muito politizado, ele desenvolvia os temas depois de cada discurso dos vencedores. Muitos deles inflamados por questões políticas, tal qual o vencedor da categoria "Jornalismo Investigativo", que fez uma puta matéria sobre grampos telefônicos que incriminavam 'aquele senhor que mandava na Bahia'.
A premiação acabou e 'rolou a festa'.
O amiguinho todo animado, dançando juntinho, uma coisa.
E tome vinho...
Nessa hora, meu 'chiquê' já tinha ido pro caralho e eu já tava bebendo cerveja, cabelo preso, sem o paletó do terninho dançando loucamente aquelas coreografias ensaiadas dessas músicas 'aê aê aê ô ô ô'.
Mudamos de lugar e fomos dançar perto de uns amigos meus (onde tava muito mais animado, diga-se de passagem) e o amiguinho se soltou...
Abraçava meu ex-editor (que tinha a minha idade e que é muuuuuuito gente boa), dançava, pulava ao som da cantora e se divertia a valer. Eu e a mulher do meu ex-editor, olhávamos e ríamos...
E tome vinho...
Eu já tinha parado, porque sou uma mocinha consciente e tava na água mineral há muito tempo.
Acabou o show.
- Vamos embora?
- Vamoxxxxxxxxxxx... Maxxxxxxxx pra ondddddeee? Pra xxxua cazzza ou pra minha???
- Eu pra minha casa e vc pra sua. E pode passar o papelzinho pra pegar o carro que eu vou dirigindo...
- Com xxxxxerrrrrrrrtezaa, eu não tenho a menorrrr condixxxão de girigggirrr.
Ao menos um bêbado consciente...
Peguei o carro na porta da casa de shows e entrei pra dirigir.
O amiguinho sentou no banco do carona e pleft! Chapou.
'Ah, que ótimo... Bom, pelo menos eu vou ME levar pra casa bem...' - pensei.
Chegando na esquina da minha casa vi que o amiguinho não teria a menor condição de voltar sozinho.
- Amiguinho... Acorda, baby... Vc tá legal?
- slkduroifjkslmc lsdnvkjnsdjfnoerghofjlkalsf wldjskmxz
- Ah, que beleza...
Como boa Polyanna, dei meia volta e peguei o caminho da casa dele.
Mas, detalhe, eu só sabia a rua em que ele morava, em Copa, o prédio, apartamento, se tem ou não tem garagem, não tinha a menor noção...
Entrei na rua dele e parei o carro na primeira brecha que vi.
- Amiguinho, qual é o seu prédio? Se vc não me disser, não tenho como descobrir...
- Onje é que a gentche tá???
- Na sua rua, querido... Me diz onde é seu prédio...
Eu ja tava engrossando a voz, pra ele ver que eu já ia ficar meio sem paciência já já...
- Ih.... Paxxxou... Tem que faxxxer a volta...
- Putaquepariu... Onde tem que entrar, Amiguinho...
- À exxxxquerrrrdaaaa
- E agora, pego a praia?
- Ixxxxxooooo
- E depois, entro na rua Sguenis?
E ele ia mexendo com a mão, de olho semi-fechado, como se fosse pra eu ir seguindo em frente... Mas, eu TINHA CERTEZA que tinha que entrar à esquerda de novo...
- Entro aqui???
E ele mexendo a mão pra eu seguir...
- Não é aqui??????
Por um momento ele levanta do transe e grita:
- É aqqqquuuiiiii!!!!!
Fiz aquela manobra radical pra esquerda e entrei na tal rua...
- Agora, me diz onde é seu prédio... Eu vou beeeem devagar...
E ele mexendo a mão pra eu seguir...
- Aqqqquiiiiii à gireittttaaa!!!!
- Nessa garagem??????
- Ééééééé.........
Embiquei na garagem e nada do porteiro aparecer...
Pisquei farol, acelerei... Nada... Não ia apertar a buzina, eram duas e meia da manhã e...
"Fóóóóómmmmmmmmmmm!!!!"
Ele apertou a buzina...
Pelo menos apareceu o porteiro...
Cara de sono, olhou pra dentro do carro, o amiguinho fez sinal que tava beleza e ele abriu a garagem...
Entrei.
Onde estacionar?
O amiguinho indicou e daqui a pouco começa a ficar verde...
- Sai do carro, pelo menos, Amiguinho!
Quase não deu tempo...
Chamou o Raul na garagem mesmo...
Putamerda...
Estacionei o carro, coloquei o rádio (que estava na minha bolsa) e fui em direção a ele... Ele me olhava rindo...
- Que beleza...
- Vamoxxxx xxubirrr...
- Que mané subir... Toma sua chave, tá entregue, beijinho, de longe, e tchau... Eu saio por aqui mesmo...
- Nnnnnãããoooooo, sobe de elevadorrrr... Vamoxxxx pra minha cazzzzzaaaa....
- Que pra sua casa, Amiguinho, bebeu? É... Bebeu... Sem chances. Volto daqui agora.
E eu sem um puto pra pegar um táxi... Tinha meus últimos dez reais da vida e não ia sair catando um 24 horas àquela hora...
- Ficccckkkka accccckkkkkiiiii...
- De jeito nenhum, meu querido... Lamento...
Entramos no elevador e espertamente apertei o Térreo antes que ele fizesse qualquer menção de apertar o andar dele.
Chegamos no térreo e eu abri a porta do elevador.
- Tchau, querido, fica direitinho, tá bem?
- Porr favoooorrr.... Ficccckkkka accccckkkkkiiiii...
- Sem chances, baby... Beijinho...
- Tttttuddddo bemmmmm, voxxxxê que xxxabe...
E, cambaleando, ele me olhava com aquela cara de 'ah é? Vai dispensar?!'
Larguei a porta do elevador, que fechou na cara dele...
Ah, ô...
E vocês pensam que acabou?
Náááá!!!
Acordei no dia seguinte e tinha uma mensagem do 'amiguinho' na minha caixa postal.
Às NOVE da manhã...
- Oi, sou eu. Me liga.
A voz tava preocupada... Liguei de volta...
- E aí... Tá melhor?
- Nossa... Tô péssimo! Lembra que eu te falei que tinha uma reunião cedo aqui no Centro?
- Lembro... Perdeu?
- Não, mas cheguei super atrasado... Que merda... E só acordei porque a Fulana (filha dele) me acordou pra dizer que eu tinha chamado o Raul e sujado o banheiro inteiro...
- Ugh...
- Cara, como eu cheguei em casa? Vc veio dirigindo, não foi?
- Foi...
- Ai, ufa. Então não foi sonho... Hehehehe
- É... Não foi sonho...
- E como vc voltou pra casa depois????
- Peguei um táxi, ora... Com o último dinheiro que eu tinha...
- Me dá o número da sua conta que eu deposito...
- Imagina... Não precisa...
- Tá, eu te pago um chopp depois...
- Ahã... Tá...
- Bom, te ligo mais tarde pra falar com vc...
- Tá...
- Mas vc tá bem, né?
- Eu? Tô ótima...
Ah, fala sério, né não?
Relato enviado pela leitora A.B.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
1 comentários:
Olha,
De tudo isso, acho melhor vc ter chegado em casa em segurança (ainda que vc tivesse que pegar um ônibus alta madrugada) do que assumir o risco de deixar o cara dirigir.
Acho que foi mais uma questão de autopreservação da leitora do que de "vocação de boa samaritana".
Postar um comentário