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segunda-feira, 30 de junho de 2008

Espetáculo duplo: os palhaços atletas

Certo sábado no fim do ano passado tinha combinado com A Noiva uma incursão ao ensaio do Bangalafumenga na Fundição Progresso. Fauna e flora exuberante, ótimos espécimes da juventude bronzeada e criada a leite B, ambiente perfeito para recrutamento de novos funcionários ou candidatos a uma atuação em nossos luxuosos picadeiros. Tô eu, linda, loira e japonesa, de vestidinho e sandalhota, esperando minha comparsa enquanto observava a efervecência circense nas cercanias. Toca meu celular, era A Noiva. “Amiga, esquece o Banga e pode sair da fila: tem dois bofes esperando a gente na pizzaria. Tô indo aí te pegar”. Hein? Como assim? Minutos depois chega ela exuberante como sempre, maquiada e cheirosa: fazemos uma ótima dupla para empreitadas de prospecção de novos talentos circenses.

Mesmo sabendo que, se mantivessemos a programação, lograríamos êxito sem esforço concordei rapidinho. Afinal, no verão, ensaio do Banga tem todo sábado, já dois bofes nos esperando na pizzaria nem sempre tá garantido. E, como sempre digo, não tô fazendo nada mesmo, vou lá ver qual é. Como show do Banga é pra suar, eu havia apostado num visual quase pós-praia e não tinha caprichado no reboco. A Noiva, sempre prevenida, habilmente me passou uma rápida camada de massa corrida na cara. Claro, apenas para ressaltar minha beleza e brilho naturais antes de partimos para nossa pizzaria favorita.

No caminho ela explicou que um dos bofes era conhecido de outros carnavais, mas apesar de ainda não ter tido oportunidade de fazer uma entrevista longa e aplicar um teste de habilidades específicas, tinha praticamente certeza de que o rapaz tinha perfil adequado e conseguiria uma colocação na equipe dela. O outro era amigo e sócio dele. Ok, um blind date sempre tem seu valor e não se nega apoio a uma amiga numa situação dessas.

Os bofes eram atléticos e bem apessoados: cheirosos e trajando roupinhas descoladas, eram do tipo de palhaço bem criado pela mamãe. Apresentações feitas, sentamos eu e A Noiva uma em frente à outra, nas cadeiras da janela, e os bofes ao nosso lado. “Quatro chopes?”. Não, eu não bebo, disse o acompanhante dela ao pedir um suco de laranja. Mais educado e interessado em interagir, o meu fez a convessão de beber um guaraná diet. Vamos pedir uma pizza? Não, a gente jantou, disseram os palhaços, digo, rapazes. Ah, então tá, né? Quem mandou sair com atleta, mas quem sabe, papo vai, papo vem, eles não se mostram interessantes? Só que papo nem foi nem voltou, os brutos só falavam deles mesmos, de seu trabalho, de suas famílias, de seus umbigos, em torno dos quais girava o picadeiro. A Noiva e eu trocávamos olhares segurando o riso enquanto pedíamos ao garçom “Mais dois chopes, por favor”.

Távamos lá, nessa noite interessantíssima, sem saber se ríamos ou chorávamos, se dizíamos que íamos ao banheiro e corríamos pra Fundição quando, da janela, A Noiva reconhece Mendonça, descabelado, sentado no seu barril de chope de sempre, com sua tulipa na mão, bebericando na calçada do Antonios. Ela não teve dúvida “Tadinho, tá sozinho, vou chamar ele”. Prevendo a cena, eu já comecei a rir sozinha. Pândego, ao chegar ele pegou uma cadeira, pediu licença e sentou entre mim e meu acompanhante “Não tô atrapalhando nada não, né?”, disse rindo sadicamente. Dessa vez acertou, Mendonça. Para nossa alegria e redenção, ele nem esquentou a cadeira e começou a metralhar os caboclos. “Ih, vocês não bebem não, é? Saem com duas morenas dessas e tomam suco? Isso não é papel de macho? Ih, são atletas? Ah, sabia! São namorados, coisa de viado!”, foi só o início. Um dos palhaços riu amarelo “direto ele, né?”. Mendonça salvou a noite.

Conta paga, descemos e nos despedimos de Mendonça, que entrou num táxi rindo da nossa cara, satisfeito e esfuziante. Os brutos não perguntaram pra onde íamos ou se queríamos carona, apertaram nossas mãos (?!) e disseram “tchau”. Eu e A Noiva demos o braço e fomos andando pra casa.

- Que que aconteceu aqui, amiga?
- Não sei, mas foi estranho. Eles saíram da Barra da Tijuca pra vir até aqui pra tomar um suco de laranja e ir embora?
- Eles são mal educados, nem se ofereceram pra levar a gente embora. Aliás, nem perguntaram onde a gente morava e como ia embora. Ainda bem que encontramos Mendonça, pelo menos rimos um pouco.
- Puta que pariu, ele vai me zoar muito segunda-feira.

Nisso, já távamos na esquina de casa quando decidimos que a noite ainda não estava perdida, demos meia-volta e resolvemos ir pra tomar uma saideira na sinuca. Tamos paradas no sinal pra atravessar a rua e quem passa de carro? Os palhaços. E né que pararam?

- Tão perdidas aí?
- A gente vai tomar uma saideira na sinuca.
- Beleza, vamos com vocês.

Eu e ela nos olhamos entendendo menos ainda, mas.... quem sabe eles se arrependeram, né? Esperamos os brutos estacionarem na calçada e entramos os quatro. Dessa vez nem demos trela. Pegamos uma mesa e pedimos logo um balde de batata frita com queijo ralado, uma cerveja e quatro copos. Um deles se esquivou e voltou sugando seu guaraná pelo canudinho. “Não tinha light!”. Ah, que peninha! O outro ficou meio sem graça e fingiu que bicava o copo de cerveja.

Mas né que eles pareciam mais soltinhos agora? Um colou nela e o outro em mim e disseram que iam nos ensinar a jogar. Hummmm..... Entre uma lição e outra, até parecia que ia rolar alguma coisa. A Noiva, otimista toda vida, brasileira que não desiste nunca, sussurou “acho que eles são só tímidos”. E eu sou uma empada, com azeitona e tudo.

Pois é, meus amigos. Quando o dia clareou eu decretei que tava com sono e de jogar sinuca e tomar cerveja meu cu já tava ardendo. O palhaço que fingiu que bicava a cerveja, disse que tava até com dor de cabeça. O outro devia estar bebado de guaraná. Nos levaram em casa e até deram um beijinho de tchau. “A gente marca outro dia”. A gente quem, cara pálida?

No elevador eu minha companheira de infortúnio ríamos uma da cara da outra.
- Onde você achou essas peças não tinha mais não, né?
- Pior foi você que entrou na minha e veio sem nem conhecer os palhaços.
- Puta que pariu, não tô acostumada a ser tratada assim não! Fui humilhada!
- Fala sério, podem ser atletas sarados, mas aqueles palhaços não pegam mulher melhor que a gente não. Nós somos lindas, cheirosas, gostosas e inteligentes! Eles deviam era ter caído matando!
- Que que passa na cabeça deles? Pra que vieram até aqui? Pra tomar suco? Cara, será que eles são namorados mesmo? Porra, conheço eles há anos e nunca pareceu biba.
- Cara, acho que não são gays não, só não gostam de buceta. Devem tocar punheta se olhando no espelho, admirando o próprio abdome definido.

É amigos, é isso aí. Não preciso dizer que Mendonça espalhou para repartição inteira. Claro, como não tenho vergonha na cara, contei o desfecho da história pra ele, dei a Mendonça o gosto de tripudiar mais um pouco.

A Noiva contou que, de vez em quando, o caboclo liga pra ela “E aí, vamos tomar um chope?”. Claro, ouve “Pára de palhaçada, você não bebe chope. Vai tomar suco com seu amigo”.

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