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terça-feira, 1 de julho de 2008

A clássica do palhaço que marca e não aparece
ou Foda adiada, foda perdida

Em mais uma parceria com A Noiva, minha companheira em empreitadas arriscadas, tomei um dos bolos mais bonitos da minha vida.

Foi numa sexta-feira de primavera no ano passado. Tava meio frio, mas como ia pra um lugar fechado, dava pra sair de vestidinho de alcinha. Botei um dos meus favoritos: o preto com detalhes em verde, subi em sandalhotas de salto e parti para certa casa de show da Lapa. Nem tava na intenção de caça, fui encontrar um casal de amigos para dançar quase possuída e expulsar os demônios. Algumas horas e muitas calorias queimadas, fui ao bar pegar outro chope. No caminho percebi um morenaço belzebu me olhando. Alto, braços fortes, olhos e cabelos pretos lisos, maxilar quadrado. Benza-Deus. É disso que o povo gosta! Do balcão do bar, vi que ele virou o pescoço e me acompanhou com o olhar. Passei por ele de novo na volta. Encarei rapidamente, sorri e desviei os olhos. Mirei meus amigos, fixei o olhar neles e segui sorriso blasé no rosto. Rá! Alguns minutos depois o caboclo veio se apresentar. Advogado, 29 anos, voz grave, educado, firme, mas gentil. Muito interessante. Nos pegamos rapidinho. Fofo, espirituoso, ele ainda por cima sambava! Assim eu caso! Tem coisa mais tesuda que homem que sabe dançar? Eu não conheço. Apresentei aos meus amigos e fui apresentada ao amigo dele. Lá pelas tantas ele ensaiou o número do construtor de castelos, mas cortei rapidinho e o bruto entendeu o recado. Quase no fim da noite confessou que tinha mentido a idade: tinha 24 anos, mas achou que se falasse a verdade eu não ia ficar com ele. Tolinho! Mentirinha perdoada.

Beijamos, rimos, sambamos e bebemos bastente até de manhã. Trocamos telefones, demos uns amassos, tudo ótimo, noite perfeita até então. Só saímos de lá quando desligaram o som. Fomos nos despedir e ele me chamou pra ir pra casa dele. Putz, eram seis horas da manhã de sábado e eu tava acordada desde às 8h de sexta. Tinha trabalhado o dia todo e sambado a noite toda. Tava acabada e com os pés inchados e enlameados. Cara, eu não ia dar no couro naquelas condições. Sem falar que o mancebo morava na Barra da Tijuca e távamos na Lapa: eu tava a três quadras de casa. Não ia me despencar pro outro lado da cidade, pra casa de um desconhecido, refém dele pra me trazer de volta, por mais gostoso que esse desconhecido fosse. Expliquei que tinha adorado conhecer ele, mas que tava cansada e talz. Lembrei que ele tinha meu telefone, que, se quisesse me ver de novo, podia me ligar outro dia e marcaríamos algo. Que seria melhor estando descansados, que poderíamos tomar um chope, conversar melhor e ficar mais íntimos. Tudo bem, ele concordou e me levou em casa. Demos uns amassos na portaria e subi, afinal já tava dia claro.

Acordei com o um SMS dele dizendo que tinha adorado me conhecer, que tinha chegado em casa e tava pensando em mim e blábláblá. Normal, até aí morreu neves, eles sempre mandam esse torpedinho clássico, acho que é uma das lições iniciais no curso introdutório às artes circenses. Sorri e dormi de novo. Acordei linda e alegre, apesar do sábado chuvoso. Eis que, no meio da tarde, ele me liga. Perguntou se eu queria sair à noite, se tava a fim de um programa mais tranquilo, disse que poderíamos nos encontrar na Lapa, tomar um chope, comer alguma coisa, conversar mais e nos conhecer melhor. Claro benhê, quero te conhecer muuuuuito mais e melhor. Tudo combinado. Passaram algumas horas e ele ligou de novo. O amigo da noite anterior ligou chamando pra tomar um chope, tava passando por uns problemas, não tinha companhia e não queria ficar em casa. Hmmm... Achei logo que ele ia cancelar, mas ao contrário, perguntou se eu não tinha uma amiga pra chamar e sairíamos os quatro, se eu não me importasse. Se me importasse ele dispensaria o amigo e manteria o combinado. Tão gentil, eu não ia mandar a real e dizer “Colé, tu quer me comer ou não? Teu amigo tu vê sempre, ele não é crescidinho pra arrumar mulher sozinho não?”. Concordei.

Liguei para A Noiva, minha companheira de empreitadas circenses. “Amiga, descolei dois bofes pra gente pegar hoje à noite. Conheci ontem, ele ligou chamando pra sair, mas depois disse que o amigo também vinha e pediu pra chamar uma amiga. Sou tua amiga, viu? Vou botar o caboclo na tua fita. Não, o amigo não é barango não, é pegável, mas se tu não gostar azar o teu. Tá tomando antibiótico pra garganta? Ah, tu que sabe, mas é só não encher a cara. Se eles forem chatos a gente vaza. Vou marcar nove horas e a gente vai pra pizzaria, formô? Então já é”.

Apesar do vento frio e da chuva fina, às 21h estávamos eu e A Noiva, lindas, loiras, japonesas, perfumadas e maquiadas, eu de vestido e ela de saia de bolinhas, sobre nossas sandalhotas charmosas e com casaquinhos emoldurando nossos belos ombros, sorridentes e falantes. Jacaré apareceu? Nem os palhaços.

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Tá certo que tava chovendo e a Barra é longe. Tá certo que ele não sabia se eu ia dar, afinal, regulei a mixaria no dia anterior. Tá certo que o amigo dele não conhecia minha amiga. Tá certo que ele pode ter arrumado mulher melhor ou foda mais certa no caminho, mas porra, foi ele que ligou chamando pra sair. Custava ter mandado um SMS “Tive um imprevisto, não vou poder ir. Desculpe. Beijos”?

A Noiva, enrolada no seu casaquinho e quase tiritando de frio, resume a situação “amiga, acho que tomamos um bolo. Acho que esse filho da puta foi dar o cu e esqueceu da hora”.

“É amiga, tomamos toco. Duas mulheres tão lindas e maravilhosas como nós. Que absurdo. Bom, azar o deles, perdem mais do que a gente”. Nos conformamos com o desperdício de maquiagem e perfume, demos o braço e fomos dar pinta na rua. Logo encontramos um amigo nosso e contamos nosso infortúnio. Apesar de ser amigo de beber e não de comer, ele ficou indignado. “Porra, como é que os caras deixam vocês esperando? Fala sério. Por isso que depois vocês chamam a gente de palhaço”. Bebemos muita cerveja na tia, sentados em banquinhos na calçada, embaixo da marquise do posto de gasolina. Rimos e falamos bobagem. Depois eu e A Noiva fomos dormir bebinhas e felizes. Meses depois esse amigo também teve uma oportunidade no picadeiro, mas isso é assunto pra outro post. ;)

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